Maior demanda por Tesouro Selic indica preocupação com juros. Aplicações atreladas à inflação podem voltar a ficar atrativas com corte de gastos e ajuste fiscal para reduzir relação entre dívida líquida do setor público e PIB, diminuindo custo médio real da dívida do Tesouro Nacional.
Com o anúncio do ajuste fiscal, a comunidade financeira se prepara para entender como as medidas de corte de gastos afetarão os juros dos títulos públicos. É sabido que o ajuste fiscal visa reduzir a dívida pública, diminuindo a pressão sobre os juros.
As expectativas são de que as medidas de corte de gastos implementadas pelo governo não serão suficientes para atender às necessidades do mercado financeiro. Apesar disso, os juros podem começar a cair, uma vez que o governo busca reduzir a dívida pública e a pressão sobre os juros. O corte de gastos deve ser bem estruturado para evitar impactos negativos sobre a economia. Além disso, medidas de corte de gastos devem ser implementadas com cuidado para evitar impactos negativos sobre a economia.
Desafios Fiscais no Brasil: Uma Análise
O Brasil enfrenta um desafio fiscal grave, refletido no aumento consistente da relação entre o tamanho da dívida pública e o Produto Interno Bruto (PIB) desde 2015. Para entender esta situação, é importante investigar o período anterior. De 2010 a 2014, a dívida líquida do setor público como proporção do PIB diminuiu 7 pontos percentuais. Isso ocorreu devido ao crescimento da economia brasileira e ao acúmulo de reservas internacionais no período. Nesse mesmo intervalo, o custo médio real da dívida do Tesouro Nacional foi de 4,7% ao ano, significando o montante dos juros pagos acima da inflação para financiar o estoque de títulos emitidos.
A taxa Selic média entre 2010 e 2014 foi de quase 10% ao ano, e a inflação média ficou em torno de 6% ao ano. Embora nem toda a dívida do Tesouro seja corrigida pela taxa Selic, o nível da taxa básica tem relação direta com o custo dos títulos do Tesouro. As despesas médias com os juros nominais do governo federal e do Banco Central no período foram de 3,6% do PIB, e o superávit primário médio foi de 1,4% do PIB. Em resumo, o superávit primário do período 2010 a 2015 não foi suficiente para compensar a despesa com juros.
Mesmo assim, a dívida líquida do governo caiu devido ao aumento do PIB e à melhora das contas externas. A partir de 2015, a situação muda. A relação entre a dívida líquida e o PIB aumenta 32 pontos percentuais, o país passa a ter um déficit primário médio de 2,3% do PIB, e as despesas médias com juros aumentam para mais de 5% do PIB. Uma das razões para isso foi a grande recessão do período 2015-16, quando o PIB caiu quase 7%. Depois houve novamente queda de 3% do PIB em 2020, dessa vez combinada com o déficit primário de 10% do PIB para combater os efeitos da pandemia da Covid-19.
Nos anos de 2020 e 2021, o custo real para o financiamento da dívida pública foi negativo, o que contribuiu para diminuir os impactos dos gastos primários sobre o aumento da dívida pública. No entanto, a partir de 2022, a taxa de juros acima da inflação voltou a subir, para mais de 7% ao ano. Os juros maiores sobre uma dívida maior aumentaram a proporção das despesas com juros nominais sobre o PIB para mais de 6%. Somado a um déficit primário de 2% do PIB levou a necessidade de financiamento do setor público para os atuais 8,5% do PIB. Essa é a magnitude do ajuste fiscal que seria necessário para estabilizar o crescimento da dívida em relação ao PIB. São medidas inviáveis de serem adotadas.
Cuidado com as análises catastrofistas: A sugestão dos economistas do mercado financeiro é cortar os Benefícios de Prestação Continuada (BPC), desvincular as aposentadorias do valor do salário-mínimo, eliminar a política de valorização real do salário-mínimo e acabar com os gastos obrigatórios com saúde e educação. Qualquer medida fora desse receituário, de acordo com essa visão, não atacaria estruturalmente as causas do problema, destacando a importância dos juros no contexto fiscal do país.
Fonte: @ Valor Invest Globo
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