O anúncio do pífio pacote fiscal é uma aula sobre desconstruir expectativas: tomada-de-decisões, sinais-que-indiquem cenários-ainda-piores, despesas-e-dos, política-monetária.
É comum que as expectativas influenciem nossa percepção da realidade, o que pode levar a equívocos em nosso julgamento. Nesse contexto, a percepção pode ser influenciada por sentimentos de otimismo ou pessimismo, e pode até mesmo afetar nossa economia, a ponto de nos levar a tomar decisões equivocadas, como em momentos de crise.
Um exemplo disto é o que ocorreu nos Estados Unidos em 2008 com a aprovação do pacote de R$2,8 trilhões, com o objetivo de estabilizar a economia e realizar um grande estímulo fiscal. O pacote foi aprovado pelo Congresso estadunidense em setembro de 2008 e teve como objetivo criar empregos e reativar a economia. No entanto, o impacto foi insuficiente, o que levou a uma reeleição do presidente Barack Obama, em 2012, com base em sua promessa de realizar mudanças na legislação fiscal, que era vista como um obstáculo para a recuperação da economia. O governo Obama, então, trabalhou com o Congresso para aprovar o pacote de estímulo fiscal, que foi aprovado em fevereiro de 2009, no valor de R$1,8 trilhão. O pacote de estímulo fiscal foi uma medida importante para a recuperação da economia dos Estados Unidos, mas ainda foi insuficiente para resolver os problemas da economia estadunidense.
A expectativa de uma economia em transformação
À medida que o prazo para o anúncio do pacote fiscal se alonga, cresce a ansiedade e a expectativa de um resultado que possa impulsionar a economia. No entanto, a demora suscita cenários ainda mais sombrios, especialmente para aqueles que já não têm fé na capacidade do governo de implementar medidas eficazes. A tomada-de-decisões é crucial, pois o pacote, que visa gerar uma economia de R$ 30 a R$ 40 bilhões ao ano, precisa aliviar a pressão sobre as despesas e os chamados ‘pentes-finos’.
É importante lembrar que os analistas especializados em orçamento público estimavam uma necessidade de R$ 70 bilhões, com um mínimo de R$ 40 bilhões. O desafio é reduzir o ritmo de crescimento das despesas, algo que o governo afirma estar fazendo desde que tomou posse. No entanto, a proposta de elevação do limite de isenção de IR para R$ 5.000, uma medida de clara motivação política, pode ter o efeito de um Cavalo de Tróia para a economia.
A impressão é que o governo talvez tenha desperdiçado sua última chance de colocar a economia em uma rota de crescimento sustentável, com inflação em torno da meta e expectativas positivas. O relatório Focus publicado no início do ano indicava inflação de 3,90%, PIB de 1,60%, câmbio de R$ 4,95 e Selic a 9% no final do ano. Já no último Focus, 29/11, somente o PIB evoluiu positivamente, para 3,22%. A inflação está acima do teto da meta, em 4,71%, câmbio em R$ 5,70 e Selic em 11,75%.
Sobre as boas notícias vindas do PIB e desemprego, há um forte consenso entre analistas de que elas se devem ao forte impulso fiscal promovido pelo governo. Só neste ano, a relação dívida/PIB já acumula crescimento de 4,2%. Como contrapartida, a política monetária tem sido mais contracionista.
A deterioração das expectativas não pode ser imputada exclusivamente ao governo. Enchentes no Rio Grande do Sul, queimadas no Centro Oeste e aumento do risco Global com as tensões geopolíticas são fatos fora do domínio. No entanto, os princípios da boa gestão nos ensinam que, quando o mundo conspira contra, o melhor a fazer é redobrar os esforços no que depende de nós. Porém, quando se parte do diagnóstico errado, fica muito difícil de reparar o dano.
Me parece que o governo começou a perder a guerra pela credibilidade em abril passado, quando encaminhou Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) em que propôs rever as metas de superavit fiscal de 2025, de 0,5% para 0% do PIB, e de 2026, de 1% para 0,25%. Este fato marcou o primeiro grande choque de reversão de expectativas, advindas da desconfiança sobre o governo.
Fonte: @ Valor Invest Globo
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